A palavra usada como arma de ferir o ar
Meio insosso de espalhar a ventos de norte
Idéias absurdas e platonicidades de um ser
Mesquinhez de espírito fugacidade do querer
Colorir telas inexistentes e sabores amargos
Que nunca presenteado foi a ninguém
Mais um, mas uns, gritos de virilidade
Porta entre aberta é convite ou não?
O grito desesperado à multidão iludida
EU, tenho sou posso fiz ganhei ensinei
E todos os verbos em primeira pessoa
E do outro lado do rio uma criança chora
Com cacos de vidro nas mãos desejando paz
Absolvição de si própria pela dor fútil
Que a carne trêmula e voluptuosa infringiu
A noite se foi, mas não levou consigo a escuridão
Dias que durou uma única noite que ainda não acordou
Prefiro acreditar que é a falta de luz que não te deixa ver
Que um circo é mais bonito sem bestas-feras
Que comece o show, pois o palhaço terminou seu roteiro
E a criança com seus vidros e sua dor veio lhe prestigiar
Mais um, mas uns silêncios incompreendidos
Entre o gozar e o amar encontraria um mar de porquês
Mas o gozo veio enfim dias depois com palhaço de maior preço
Mais um, mais uns reflexos turvos no espelho
A sonoridade da pretensão é harmônica
Encontrar em palavras alheias a vida e o amor que nunca tivera
Porque tem ego ferido de viajante solitário, Infante renegado
Incompreendido de fato ou complexado por essência?
Não, não escuto a sonoridade do seu barquinho
Navegando por águas rasas para não afundar no abismo da normalidade
Deus, uma criança em porta de circo
Engolindo vidros por mero descuido
Como saber que a insanidade a tomou
Se ela não fala e você não escuta?
Mas as palavras pulsantes em vazios de embriaguez
São memórias apagadas de um gozar egoísta
O ego grosseiro nublando o discernimento
O sorriso amarelo que subjugas também está no teu rosto
A inquietude, o incômodo da presença muda é fato
Fotografia de uma vergonha que não emana da carne em si
Mas dos murmúrios levianos que ecoam espaços vãos
Sobre a criança, seus sorrisos, sua quietude e seus vidros
Não, esta criança não ama ninguém
Porque lhe sobram palavras e planos
Falta espaço para amor e até mesmo o ódio incitado em si morreu
No coração da criança inventada que morre e mata por um amor sujo
Mas como amar desprezível Ser que inventa ser o que nunca foi?
Que as cortinas do circo se fechem, preciso de novo roteiro
Trabalhar com mentiras é mais fácil, mas faíscas também queimam
Como cansar do que nunca teve?
Como falar de amor se nunca amou?
Como falar de beleza se o olho duro, envidrado só enxerga a sua falsa paz
Mais um, mais uns gritos desesperados
E se cremos de fato que palavra é poder
Permito-me presentear à criança de garganta estilhaçada
Toda calma que houver nessa vida, e mais um pouco por garantia
Ao palhaço de palavras artistas o sentimento mais cristão que houver
Que é também nota musical
Mais um, mais uns personagens bem sucedidos
Rochedo também esfacela contra o mar de fantasias
Ainda que leve uma vida inteira, todo personagem um dia morre
E os murmúrios levianos, enterre-os com ele
E os enganos tempestuosos enterre-os com ele
E o amor que você nunca terá porque sequer existiu
Esse não enterre, continue alimentando-se dele
Pois te rende ótimas poesias
Liberdade é vento de fim de tarde
Ainda vejo o seu barquinho afundando aos poucos
No lago fúnebre da sua solidão
E do outro lado do rio uma criança chora
Com cacos de vidro nas mãos desejando paz
Absolvição de si própria pela dor fútil
Que a carne trêmula e voluptuosa infringiu
E como provar que o sorriso é triste?
Há muito de calma no coração de uma criança.